O xadrez dos chips: a China faz um lance que mexe no tabuleiro global

29 de setembro de 2025

por Redação The Shift

O xadrez dos chips: a China faz um lance que mexe no tabuleiro global

De repente, não mais que de repente, o governo da China determinou que empresas nacionais suspendam os pedidos do chip RTX Pro 6000D, da Nvidia. O semicondutor que é produzido para workstations pode ser reaproveitado para aplicações de Inteligência Artificial (IA). A instrução, que na China assume o caráter praticamente de lei, provocou dor de cabeça: nas negociações nos EUA, as ações da Nvidia caíram 2,7%, enquanto as ações da rival AMD caíram quase 1%.  

O CEO da Nvidia, Jensen Huang, que participava de uma conferência do Financial Times e foi pego no meio da disputa, disse que Washington e Pequim “têm agendas maiores para resolver”. Mas pouco depois a Nvidia recuperou a vantagem ao anunciar um investimento de US$ 5 bilhões na Intel e um plano para que, juntas, as empresas desenvolvam chips para computadores e data centers. O que representa uma “ameaça” para a taiwanesa TSMC. As ações da Intel subiram cerca de 23% com o anúncio, enquanto as da Nvidia tiveram valorização menor, mas também positiva. Por consequência, a participação de 9,9% do governo dos EUA na Intel passou a valer aproximadamente US$ 13 bilhões.  

No mesmo diaa Huawei anunciou uma nova geração de seus chips Ascend, que seriam potenciais concorrentes da Nvidia. O pipeline de produção se estende pelos próximos três anos, com o primeiro chip chegando até março de 2026 e o segundo no quarto trimestre. A empresa pretende lançar duas linhas em 2027 e 2028. Mais um movimento na rivalidade com a Nvidia.

No xadrez da supremacia tecnológica e geopolíticaa China transformou semicondutores em moeda de troca. Tudo isso na mesma semana em que China e Estados Unidos discutem o tarifaço imposto pelo governo Trump. Como o xadrez é feito de vários movimentos, vale conferir quem está se saindo bem até agora, e quem pode se dar muito mal.

 

Veja quem está se movimentando nesse tabuleiro

Se tudo se concretizar, o jogo pode mudar, de novo, em meio à escalada da chamada guerra dos chips.
 

Um pouco de contexto

 

No centro da Guerra dos Chips estão justamente os chips de IA – GPUs de altíssimo desempenho e aceleradores especializados, essenciais para treinar e rodar modelos de IA.

A Nvidia domina esse segmento globalmente, mas os EUA impuseram controles severos para restringir suas vendas à China, temendo que os chips sejam usados para fins militares ou de vigilância. A resposta chinesa foi imediata: fortalecer a produção nacional. Huawei lidera esse esforço com a linha Ascend, que vem ganhando desempenho e escala, mesmo com restrições tecnológicas.

Ao mesmo tempo, a Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC), maior fabricante mundial de chips para IA, virou peça central da tensão. Um possível conflito envolvendo Taiwan poderia comprometer cadeias globais. Por isso, os EUA passaram a apoiar fortemente a Intel como alternativa doméstica, inclusive com subsídios bilionários via CHIPS Act.

Nesse contexto, cada movimento estratégico  de bloqueios a parcerias  tem efeito de dominó na economia global. O equilíbrio entre segurança nacional e dependência tecnológica está cada vez mais frágil. E como em todo bom xadrez, um lance inesperado pode virar o tabuleiro mais uma vez.

 

E dos complicadores

 

Falando no 2025 World Knowledge Forum (WKF), realizado no início do mês, na Coreia do Sul, Chris Miller, professor da Universidade Tufts e autor do best-seller global “Chip War”, alertou que o treinamento de especialistas em IA e a expansão da cadeia de suprimentos de semicondutores serão a força motriz por trás do crescimento da indústria. “Nenhum país possui todos os elementos da cadeia de suprimentos de semicondutores”, disse Miller. “Nenhuma nação é autossuficiente em componentes semicondutores, nem está sequer perto de atingir a autossuficiência.”

Miller projetou que a competição deve se intensificar porque as cadeias globais de IA dependem do mesmo conjunto limitado de equipamentos, e os fabricantes desses materiais são poucos. “Estados Unidos e China também estão insatisfeitos com o atual ecossistema da cadeia de suprimentos de semicondutores, mas são forçados a competir ferozmente para sobreviver”, acrescentou.

“Resolver problemas na cadeia de suprimentos exigirá colaboração entre vários países, empresas e instituições de pesquisa. Sem abordar as reais preocupações com a segurança e os conflitos políticos, as soluções para a cadeia de suprimentos permanecerão ilusórias”, afirmou.

Além disso, a empreendedora Anastasiia Nosova lembra que, em 2007, 12 empresas podiam fabricar chips nos nós mais avançados da indústria. Hoje, restam apenas duas: TSMC e Samsung Electronics. Construir uma fábrica de ponta é extremamente intensivo em capital. Os custos iniciais excedem US$ 20 bilhões, com bilhões adicionais a cada ano apenas para manter a competitividade. Razão que faz com que gigantes como Apple, Nvidia, AMD, Broadcom e a maioria das startups de IA permaneçam sem fábrica própria.

A Intel ainda está lutando para voltar à vanguarda com as tecnologias de fabricação 18A e 14A. Conseguirá? Os próximos 2 a 3 anos serão decisivos. Quão inovadora a China será não só no design, mas na também na fabricação local de semicondutores? O último relatório do Yole Group, “Status of the Wafer Fab Equipment Industry 2025”, revela o surgimento de uma série de fornecedores de equipamentos para a fabricação de semicondutores, ainda desconhecidos fora da China.

Os chineses já desafiaram as previsões dos especialistas ocidentais sobre DRAM. A ChangXin Memory Technologies, Inc. (CXMT) reduziu significativamente a lacuna tecnológica, produzindo chips de memória DDR5 usando um processo de nó de 16 nm. Seria uma temeridade desconsiderar a possibilidade de autossuficiência chinesa na produção de chips para IA em algum momento, em um futuro não muito distante.

 

Sinais de impacto


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